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Default Mode Network (rede de modo padrão): o impacto dos psicodélicos, resumo e anormalidades
Atualizado: 22 de dez. de 2022

O que se sabe sobre o impacto dos psicodélicos no funcionamento das redes cerebrais? Entre estas substâncias, a psilocibina é a que possui mais dados e maior relevância no tratamento dos transtornos mentais. Estudos demonstram que a psilocibina apresenta propriedades de modulação da Default Mode Network (DMN), e pode desintegrá-la de forma aguda e integrá-la em seguida, com um funcionamento normal. Em outras palavras, existe um consenso crescente de que a psilocibina e outros psicodélicos podem resetar o cérebro às configurações de fábrica, além de modular a expressão de genes e mediadores inflamatórios. Mas afinal, o que é a DMN? Qual é a relação das anormalidades desta rede com os transtornos mentais?
A DMN é uma rede de modo padrão cerebral, que é ativada quando a mente divaga e o indivíduo não está focado no mundo exterior. É um estado introspectivo onde o cérebro não está envolvido em atividades direcionadas a objetivos. O conceito de DMN vem de evidências que demonstram que ao iniciar uma tarefa, ocorre um padrão de desativação de uma rede de regiões cerebrais que inclui o córtex cingulado posterior/pré-cuneo (CCP), córtex pré-frontal medial (CPFM) e o córtex parietal medial, lateral e inferior. Embora desativada durante a execução de tarefas, a DMN fica ativa no cérebro em estado de repouso, com um alto grau de conectividade funcional entre as regiões cerebrais. Esta atividade de repouso é denominada de “modo padrão de atividade cerebral”, e trata-se de um estado em que um indivíduo está acordado e atento, mas não envolvido ativamente em uma tarefa que exige atenção. Estados de repouso mais longos, em que há uma menor desativação da DMN, têm sido associados às falhas momentâneas de atenção e desempenhos menos precisos em tarefas que exigem controle atencional. Nesta ocasião, é observada uma atividade reduzida nas regiões cerebrais de controle frontal, como o giro frontal inferior direito (GFI), giro frontal médio (GFM) e o córtex cingulado anterior (CCA). A atividade da DMN também persiste em um grau considerável durante tarefas sensoriais simples, estágios iniciais do sono, e em menor grau, sob sedação consciente. É importante ressaltar que o funcionamento desta rede pode diferir de acordo com a idade, sexo, função cognitiva e orientação sexual. Fatores ambientais como maus-tratos na infância, também podem influenciar sua conectividade funcional.
Porém, as anormalidades da DMN estão envolvidas apenas nos diversos transtornos mentais, como a ansiedade, autismo, déficit de atenção e hiperatividade, depressão, esquizofrenia, Alzheimer, entre outros. Estas disfunções parecem implicar na conectividade alterada e na relação antagônica entre a DMN e a rede de atenção (tarefa-positivo) nos sistemas cerebrais de funcionamento normal. Por exemplo, há dados que sugerem um aumento significativo de conflitos entre a DMN e a tarefa-positivo na esquizofrenia. Isto reflete no aumento do antagonismo e na competição excessiva entre estas redes, e provavelmente contribuem com os sintomas de esquizofrenia, como a super-mentalização e o déficit de controle atencional. Especula-se que esse padrão atípico de conectividade pode causar alterações na memória de trabalho e controle atencional. Na doença de Alzheimer, existe uma conectividade reduzida entre o hipocampo direito e muitas regiões da DMN, que provavelmente está relacionada a uma disfunção da memória de trabalho e dos processos de atenção. Da mesma forma, parece haver uma conectividade funcional irregular da DMN nos adolescentes com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), mais especificamente entre os componentes do CCA e CCP. No autismo, a conectividade é reduzida na DMN, também entre o CCA e o CCP, e causa uma perturbação do processamento autorreferencial e emocional. Na depressão, são observadas aberrações na conectividade funcional da DMN no córtex cingulado subgenual, e na ansiedade, há uma redução da desativação do córtex pré-frontal medial, embora seja questionável se estes achados se relacionam com uma disfunção específica desta rede.
A neurociência é um território em constante exploração. Existem muitas hipóteses não esclarecidas e que podem mudar a qualquer momento. A causa das anormalidades na DMN e seu impacto nos transtornos mentais ainda permanecem um mistério. Somente estudos futuros devem investigar profundamente as variações que envolvem o funcionamento desta rede.
Referências
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